Noite de terça-feira, alguns
salgadinhos e refrigerantes fizeram companhia pra nossa solidão, a minha e da lua.
Brilhava bonito, mais que o normal. É engraçado como ela faz seu papel de
coadjuvante ser importante ao ponto de confundirmo-nos, se é mesmo o
protagonista seu parceiro da peca do teatro. Sempre quando ela entra em cena
ele já saiu, ou se não saiu é ofuscada pelo seu reluzir, bom a noite prossegue
e me incomoda o fato das sirenes ligadas ultrapassarem as barreiras impostas
pela física dos travesseiros na nuca. Se eu fosse o sol, o sono faria o papel
de lua, só viria quando eu não estivesse, e como não existe forma de não estar,
o sono não viria. Noite eterna seria aquela de terça-feira. Que falar sobre seu
começo estranho? soaria sombrio, ou até mesmo pabulagem, Café mal passado,
camisa mal passada, e o passado? bom... Aquela ligação interrompendo o meu
vicío matinal de gargarejo, jornal e panqueca não me incomodaram, eu ouvia
aquela voz feminina robô enquanto me concentrava na busca incessante pelo
ingrediente perdido, “-açúcar refinado!”, comemorei alto, interrompendo a moca simpática
e previsível do outro lado da linha ao findar dentro do armário encontrando o
tao procurado ingrediente. Depois dos primeiros segundos de reflexão da
mocinha, percebendo que nada daquilo era com ela, prosseguiu com seu discurso
de boa vendedora e eu prossegui com meu malabarismo de elementos. Pescoço desconfortável
com aquela tortidao causada pelas Mãos ocupadas de cozinheiro de quinta (ou de
terca de manha). Eu refutava “Não, obrigado”, repeti aquela mesma sentença, por
algumas dezenas de vezes até a desistência da robô. E quando finalmente o
telefone resolveu fazer morada no gancho, na troca de bolas e confusões mentais
daquele instante, casca de ovo pro gancho, telefone pra frigideira e panqueca
pro lixo, mas que burro não? Parece inconcebível tamanha tolice, mas em questão
de segundos me arremessei em desespero em cima da frigideira e me perdi em
devaneios tolos causados pela fome, e no meio do caminho resolvi salvar a
panqueca pela regra dos 3 segundos de contaminação, e fiquei naquele impasse, e
duvida enquanto milésimos corriam, e aquela cena, em câmera lenta se passava
para os expectadores divinos que com certeza riam, eu ia de um lado pro outro
sem saber o que fazer.. E o telefone tocou novamente. Peguei antes mesmo de
terminar o primeiro chamado, com um misero centímetro de sua capa deformada
pelo calor,”Aloo?” eu me voltei pra lixeira, procurando aquela panqueca, que
tal fome naquele momento e stress causados pelas recorrências dos
acontecimentos, cegou-me de que aquilo agora provinha da lixeira, já passava
dos 3 segundinhos malditos, agora com a panqueca na Mao e o pescoço torto
novamente, falava com a boca cheia. “aaaai”, gritei novamente deixando o
telefone cair no chão e espatifar-se por completo. Era muito pouco tempo pra
pegar tanta temperatura, bom nunca fui bom em física, e nem em dissipação de calor,
e agora estava com a orelha queimada, me sentia um idiota, batia a panqueca no
meu rosto por seguidas vezes ate despedaça-la por completo também, pura
loucura! Pura comedia para os divinos, trabalho teve Soraia, a moca que limpa meu
apartamento nas tercas, tadinha, minha única companhia nessas ultimas semanas.
Eu agora sem namorada, que terminou por motivos de falta de atenção, dizia ela,
sem emprego por derramar café no chefe, motivo tolo? Concordo. Era só eu e a
lua, dividindo salgadinhos e refrigerante com o vento na janela. Sem panqueca,
sem café, sem ligações de telemarketing, sem confusões mentais e comedias
divinas. Foi apenas um terço da terca. Imagina que dia, E eu não paro de
lembrar disso... e essas sirenes que não param de tocar, e esse travesseiro que
não cobre o som, e esse sono que não chega! Ta parecendo sol e eu lua. E eu
achando que seria só coadjuvante.
(Gustavo Neves)
(Gustavo Neves)
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