quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Um terço de Terça


Noite de terça-feira, alguns salgadinhos e refrigerantes fizeram companhia pra nossa solidão, a minha e da lua. Brilhava bonito, mais que o normal. É engraçado como ela faz seu papel de coadjuvante ser importante ao ponto de confundirmo-nos, se é mesmo o protagonista seu parceiro da peca do teatro. Sempre quando ela entra em cena ele já saiu, ou se não saiu é ofuscada pelo seu reluzir, bom a noite prossegue e me incomoda o fato das sirenes ligadas ultrapassarem as barreiras impostas pela física dos travesseiros na nuca. Se eu fosse o sol, o sono faria o papel de lua, só viria quando eu não estivesse, e como não existe forma de não estar, o sono não viria. Noite eterna seria aquela de terça-feira. Que falar sobre seu começo estranho? soaria sombrio, ou até mesmo pabulagem, Café mal passado, camisa mal passada, e o passado? bom... Aquela ligação interrompendo o meu vicío matinal de gargarejo, jornal e panqueca não me incomodaram, eu ouvia aquela voz feminina robô enquanto me concentrava na busca incessante pelo ingrediente perdido, “-açúcar refinado!”, comemorei alto, interrompendo a moca simpática e previsível do outro lado da linha ao findar dentro do armário encontrando o tao procurado ingrediente. Depois dos primeiros segundos de reflexão da mocinha, percebendo que nada daquilo era com ela, prosseguiu com seu discurso de boa vendedora e eu prossegui com meu malabarismo de elementos. Pescoço desconfortável com aquela tortidao causada pelas Mãos ocupadas de cozinheiro de quinta (ou de terca de manha). Eu refutava “Não, obrigado”, repeti aquela mesma sentença, por algumas dezenas de vezes até a desistência da robô. E quando finalmente o telefone resolveu fazer morada no gancho, na troca de bolas e confusões mentais daquele instante, casca de ovo pro gancho, telefone pra frigideira e panqueca pro lixo, mas que burro não? Parece inconcebível tamanha tolice, mas em questão de segundos me arremessei em desespero em cima da frigideira e me perdi em devaneios tolos causados pela fome, e no meio do caminho resolvi salvar a panqueca pela regra dos 3 segundos de contaminação, e fiquei naquele impasse, e duvida enquanto milésimos corriam, e aquela cena, em câmera lenta se passava para os expectadores divinos que com certeza riam, eu ia de um lado pro outro sem saber o que fazer.. E o telefone tocou novamente. Peguei antes mesmo de terminar o primeiro chamado, com um misero centímetro de sua capa deformada pelo calor,”Aloo?” eu me voltei pra lixeira, procurando aquela panqueca, que tal fome naquele momento e stress causados pelas recorrências dos acontecimentos, cegou-me de que aquilo agora provinha da lixeira, já passava dos 3 segundinhos malditos, agora com a panqueca na Mao e o pescoço torto novamente, falava com a boca cheia. “aaaai”, gritei novamente deixando o telefone cair no chão e espatifar-se por completo. Era muito pouco tempo pra pegar tanta temperatura, bom nunca fui bom em física, e nem em dissipação de calor, e agora estava com a orelha queimada, me sentia um idiota, batia a panqueca no meu rosto por seguidas vezes ate despedaça-la por completo também, pura loucura! Pura comedia para os divinos, trabalho teve Soraia, a moca que limpa meu apartamento nas tercas, tadinha, minha única companhia nessas ultimas semanas. Eu agora sem namorada, que terminou por motivos de falta de atenção, dizia ela, sem emprego por derramar café no chefe, motivo tolo? Concordo. Era só eu e a lua, dividindo salgadinhos e refrigerante com o vento na janela. Sem panqueca, sem café, sem ligações de telemarketing, sem confusões mentais e comedias divinas. Foi apenas um terço da terca. Imagina que dia, E eu não paro de lembrar disso... e essas sirenes que não param de tocar, e esse travesseiro que não cobre o som, e esse sono que não chega! Ta parecendo sol e eu lua. E eu achando que seria só coadjuvante.

(Gustavo Neves)

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